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sábado, 27 de junho de 2015

O Preconceito Ideológico de uma Deputada e o País Real


Encontra-se neste momento no Parlamento uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) que cria um quadro legal de apoio à Maternidade, à Paternidade e ao Direito a Nascer, subscrita por quase 50 mil cidadãos em pouco menos de três meses.

A propósito da discussão pública desta ILC na Assembleia da República a Deputada Isabel Moreira escreveu dois artigos sobre esta e fez uma intervenção (em nome do grupo parlamentar do Partido Socialista) na audição pública da Comissão de Subscritores na 1ª Comissão Parlamentar (Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias).

Na referida intervenção a senhora deputada chama a cinquenta mil cidadãos, entre os quais se contam mais de 40 professores de Direito, que tem ideias diferentes das suas, “selvagens”, “bárbaros” ou “pré-históricos”, quando estes pedem apoio social à maternidade e paternidade, respeito pelos profissionais de saúde objectores de consciência, ou que o tempo de maternidade seja contado como tempo efectivo de estágio, etc..

Não deixa aliás de ser sintomático da falta de respeito da senhora deputada para com os representantes e subscritores desta iniciativa o facto de, na audiência pública concedida pela Iª Comissão, a senhora deputada ter condições para fazer um intervenção virulenta e insultuosa contra a Iniciativa, mas não ter condições para ouvir a resposta, tendo abandonado a sala assim que acabou de falar!

Contudo, não serve este artigo para apontar a incorrecção daquela deputada, mas os seus argumentos contra a Iniciativa “Pelo Direito a Nascer” que têm que ser respondidos, porque são falsos.

No artigo “Selvajaria Moral” publicado no Expresso, começa por dizer que esta Iniciativa é sobre a IVG, quando na verdade é sobre a Maternidade, a Paternidade e o Direito a Nascer. 
É evidente que existem pontos onde se trata do aborto legal e da portaria que o regula, mas vai para além disso.

Prossegue a senhora deputada afirmando que “A intenção dos cidadãos pró-vida é contrariar a lógica do sistema, intenção essa que trairia, se levada à prática, o espírito do nosso ordenamento jurídico (…)” mas, não fundamenta esta conclusão.

Diz ainda: “Numa palavra, a vida intrauterina tem proteção objetiva; a vida já nascida tem proteção subjetiva. Pretender equivaler estas dimensões é pré-histórico.” Em parte alguma da ILC tal é dito. Talvez a leitura tenha sido apressada…

Nem mesmo na pertença ao agregado familiar justifica a leitura injuriosa feita. Pois, a proposta de lei não concede nenhum direito pessoal, mas apenas repõe a verdade no agregado familiar.

Ou seja, tornar o nascituro parte do agregado familiar tem como resultado jurídico uma maior protecção do agregado familiar e por conseguinte do nascituro. Achar que isso é o mesmo que equiparar o nascituro e o já nascido é intelectualmente desonesto.

Diz ainda no seu artigo: “Nos termos do artigo 4º, é revogada, para todos os efeitos, a equiparação entre IVG e gravidez. Esta inconstitucionalidade significa que os signatários ignoram que o aborto espontâneo, tal como a IVG, são problemas de saúde.” Ora, IVG e aborto espontâneo são actos distintos. A ILC não trata do aborto espontâneo. Apenas faz cessar a equiparação entre a IVG e a gravidez. Ou seja, trata a IVG como todos os outros problemas de saúde, com o mesmo regime de taxas moderadoras e de baixas médicas. Não aceita é que a IVG beneficie dos incentivos à maternidade!

Mas talvez a maior desonestidade intelectual seja esta: “A desconsideração pelas mulheres continua no artigo 9º, o qual obriga a mulher a revelar as pessoas com quem teve sexo.”. 

Vejamos então qual o motivo da indignação. O artigo 9º do projecto de lei apresentado, depois de dizer que devem ser apresentadas à mulher todos os apoios disponíveis à maternidade, diz na alínea b): “No sentido do apoio à maternidade, deve também ser auscultado o outro progenitor quanto à sua capacidade no cumprimento dos seus deveres de paternidade“. Ora, esta norma visa tão só que o pai da criança se responsabilize, e que tenha o direito de ser ouvido. Sempre com o consentimento da mulher. Um preceito que visa apoiar a mulher e combater a solidão.

Também não deixa de ser preocupante que a citada deputada desconheça os números do aborto. Na Iª Comissão afirmou que só se tinham feito em Portugal 100 mil abortos a pedido da mulher. O problema é que citou os números de 2011, quando já existem números conhecidos até 2013 que nos permitem saber que já foram praticados mais de 119 mil abortos a pedido da mulher desde que a lei actual entrou em vigor.

Falta à verdade quando diz que a taxa de reincidência é de 1%. Uma coisa é a reincidência no mesmo ano (superior a 1%). Outra as reincidências desde que a lei entrou em vigor que são pelo menos 27% (pelo menos, porque o número só é conhecido se a mulher que vai abortar declarar que já o fez anteriormente).

Por fim, diz a mencionada Sra. Deputada que pôr a mulher a assinar a ecografia antes de abortar é uma “violência de estado”, porque a psiquiatra sua amiga, Dra. Ana Matos Pires, o afirma.

Poderá considerar que mostrar a ecografia a uma grávida que quer abortar é violento. E é verdade que o é. O aborto é violento, é duro e faz sofrer. Contudo, nenhum acto médico pode ser executado sem consentimento informado. De facto, em qualquer acto médico somos confrontados com radiografias, ecografias, TAC’s. Esta ILC só pretende que o mesmo critério que preside ao consentimento informado para os outros actos médicos seja aplicado ao aborto.

Concluindo, os argumentos da deputada Isabel Moreira contra a ILC “Pelo Direito a Nascer” não se baseiam na dita Iniciativa, mas sim no seu preconceito ideológico. Infelizmente, este preconceito impede um debate sério dos temas da saúde materna e dos apoios à maternidade e paternidade que o País real tanto deseja.

Por toda a Europa, e nos EUA está a ser feito um trabalho de natureza social que combata o drama do aborto em que milhares de mulheres se vêem envolvidas. Tal só se faz com verdade e abertura. Com argumentos sem rigor científico e jurídico esse trabalho é estéril.