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domingo, 9 de dezembro de 2018

Advento: a espera daqu'Ele que já É. - Partilha, Dez. 2018





Escrevo estas linhas a menos de um mês de nascer o meu terceiro filho. É provável que quando as estiverem a ler já o meu filho Zé Maria esteja em casa com os pais e os irmãos (Deus o queira!). A espera do nascimento de um filho, ainda por cima tão próximo do tempo do Natal, não pode deixar de me levar a meditar mais profundamente no tempo do Advento.
O Advento é o tempo da espera, da espera desse Menino que nos foi dado, desse Menino que é Deus feito homem. Mas esta espera é também a espera de alguém que já é, que já existe. Assim é como qualquer pai que espera o nascimento do seu filho, assim foi também para a Virgem Maria e para São José.
Porque a escritura deixa-nos claro algo que a ciência só conseguiu provar centenas de anos depois: que dentro do ventre de uma mãe está uma pessoa. Se hoje com a biologia sabemos que desde o momento da concepção estamos diante de uma nova vida, um Ser Humano que, embora totalmente dependente da mãe, tem uma identidade biológica própria, pela fé a Igreja ensina-o há dois mil anos.
Neste tempo de Advento viremos os olhos para Maria Santíssima. O Anjo anuncia-lhe que vai ter um filho. Diz-lhe também que a sua prima Isabel concebeu um filho e que já é o sexto mês daquela a quem chamavam estéril. Maria corre a visitar sua prima. Entra na casa, saúda Isabel e esta, alertada pelo filho que cresce no seu seio, reconhece que está diante do Seu Senhor. Como é isto possível? Jesus tem no máximo uma semana, pouco mais é do que um amontoado de células. E contudo, aquele amontoado de células é Deus feito Homem. Deus fez-se célula! E o primeiro a reconhecê-lo e a anunciá-lo, como voltará a fazê-lo no Jordão trinta anos depois, é o seu primo João que ainda nem nasceu!
Todos os dias a Igreja relembra este mistério, nas palavras do Angelus. Todos os dias dizemos “O Anjo do Senhor anunciou a Maria e ela concebeu pelo Espírito Santo (…) e o Verbo se fez carne e habitou entre nós”.
O Advento é tempo de mais uma vez relembrar que a nossa Fé não é sentimental ou apenas espiritual, mas profundamente carnal: Deus encarnou! Deus quis ser como nós!
Neste tempo de Advento meditemos em Maria, que acreditou desde o primeiro instante. Meditemos naquela jovem, mais jovem que muitos de nós, que durante nove meses viveu esta intimidade com Deus, de O trazer no seu ventre.
A Fé da Igreja ao fazer memória (ou seja ao tornar presente hoje) deste Deus escondido no seio de uma Virgem, ao fazer memória desta espera do Seu nascimento, proclama a santidade da vida por nascer.
No Advento esperamos Jesus que vai nascer mas que já existe. Por isso ainda hoje em Nazaré, no local da Anunciação, estão as palavras: Aqui o Verbo se fez carne! Deus fez-se carne com o Sim de Maria. Ali começa a sua maternidade.
Neste Advento pensemos em Maria, imagem perfeita de todas as mães. Pensemos como amou aquele filho desde o primeiro momento em que teve consciência da sua existência. Pensemos em João Baptista, que exulta de alegria ao reconhecer naquele monte de células a encarnação Divina. Pensemos em Isabel que proclama diante da jovem prima “Bendita és tu entre todas as mulheres, como me é dado que venha ter comigo a mãe do meu Senhor?”. E como Maria, João Baptista e Isabel esperemos também nós o nascimento deste Menino. E à imagem desse Menino, que já dentro do ventre materno era Deus, olhemos assim para todas as crianças que já existem, mas ainda não nasceram.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

O extremismo é sempre de direita?




“Extrema-direita entra no parlamento da Andaluzia.” Este é o título em mais ou menos todas as notícias dos jornais portugueses sobre as eleições na Andaluzia. Todos fazem questão em sublinhar que o VOX (que ontem elegeu doze deputados) é de extrema-direita. Estranhamente nenhum deles sente necessidade de referir que o Podemos ou a IU são partidos de extrema-esquerda.

Aparentemente o VOX precisa sempre do adjectivo de extrema-direita, mas o Podemos, que neste momento garante o poder a Pedro Sánchez, o Podemos que em paga pelo dinheiro que recebeu de Maduro continua a apoiar o regime Venezuelano, o Podemos que quer derrubar a cruz do Vale dos Caídos, que quer fragmentar a Espanha, nunca é referido como de extrema-esquerda.

Esta desigualdade de critérios não é de espantar. Lembremos que, nas eleições brasileiras, o presidente eleito era sempre o candidato da extrema-direta, mas Haddad que tinha como vice Manuela D’Ávila, do PCB, nunca era descrito como candidato da extrema-esquerda. Trump, presidente democraticamente eleito é sempre associado à extrema-direita, mas o ditador Maduro nunca é descrito como de extrema-esquerda. Marine Le Pen, Salvini, Órban são sempre populista de extrema-direita, Tsipras, Iglésias, Mélenchon nunca são de extrema-esquerda.

A verdade é que a comunicação social tem sempre muito mais complacência com a extrema-esquerda do que com a extrema-direita. Pensemos por exemplo que Che Guevara e Fidel Castro, dois assassinos sanguinários, são ainda hoje tratados como heróis. Ou para ficarmos por casa, pensemos em Otelo Saraiva de Carvalho, terroristas condenado em tribunal, que todos os anos é homenageado na nossa comunicação social.

Só isso explica que em Portugal o PNR ou o novo partido de André Ventura sejam sempre tratados como perigosos, mas que o Bloco de Esquerda e o Partido Comunistas estejam no poder. Aparentemente ser contra a imigração é perigoso, mas legislar para que crianças de 16 anos mudem de género é bom. Ser contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo é uma deriva autoritária, mas defender a nacionalização da economia já não tem problema. Em última instância, ser contra a União Europeia é bom ou mau, dependendo se quem o diz é Catarina Martins ou José Pinto Coelho!

Eu não defendo a extrema-direita. Eu também acho que os jornais têm o dever de denunciar ideias e comportamentos extremistas. Só quero é que o façam independentemente do lado da barricada de onde vêm. 

Aquilo a que assistimos hoje em dia na comunicação social é aterrador: qualquer pessoa de direita que se atreva a falar de nação, de defesa da Vida ou da Família é um extremista enquanto a esquerda pode defender o que bem lhe apetecer que está a apenas a derrubar tabus e defender o progresso.

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

A Liberdade de Educação paga a dobrar!




O artigo 36º da Constituição dispõe que os pais têm o direito e o dever de educar os seus filhos. O direito a educar os filhos é por isso um direito funcional, ou seja, um direito dos pais que tem que ser exercido em função dos filhos, devendo os pais educar os filhos da maneira que considerarem melhor. E deve por isso o Estado, uma vez que é um direito garantido pela Constituição, dar condições para que os pais possam cumprir esse dever.

Cabe assim aos pais escolher qual a melhor escola para os filhos. Se os pais considerarem que a escola mais adequada para os filhos é uma privada, isso é um direito deles. O Estado pode considerar que não tem meios para apoiar essa escolha (e poderíamos agora discutir o assunto, mas não é o tema deste artigo) e por isso deixar aos pais todos os encargos dessa escolha. Assim é em Portugal onde um pai, porque só tem oferta estatal longe, porque a escola estatal ao pé de casa não tem um bom nível de ensino, porque prefere que o filho tenha uma educação mais religiosa, porque enquanto pai e ao abrigo da Constituição considera que o melhor para o seu filho é uma escola privada, está obrigado a pagar duas escolas: as dos filhos do outros através do seus imposto e a escola do seu filho com o dinheiro que lhe sobra.

O que o Estado não pode fazer é dificultar aos pais esse direito de escolha. Infelizmente é isso que vemos acontecer. O caso mais flagrante foi a guerra da gerigonça às escolas com contrato de associação. Pela única razão da defesa ideológica da escola estatal, o Estado acabou com dezenas de contratos de associação, obrigando crianças a ir estudar para mais longe de casa e para escolas com piores condições!

Mas o novo Orçamento de Estado traz mais uma novidade na descriminação das famílias que escolhem o ensino particular: os manuais escolares para os estudantes até ao 12º ano serão gratuitos, mas só para os alunos das escolas estatais, deixando, incompreensivelmente, de fora os estudantes das escolas privadas. 

Qual é a diferença entre estudantes das escolas estatais e estudantes das escolas privadas? Os pais das crianças das escolas privadas não pagam impostos como todos os outros? Não tem que comprar manuais escolares como todos os outros? Então qual o motivo que existe para o Estado pagar os manuais a uns e não a outros?

Este apoio não é as escolas, é as famílias. Se é compreensível (mas discutível) a diferença de apoios às escolas estatais e às escolas privadas, não é compreensível a diferença de apoio às famílias, só porque umas exercem o seu direito a educar os filhos da forma como lhes parece melhor.

Bem sei que há a narrativa, ao nível da caixa de comentários dos jornais, de que os das escolas privadas são ricos e podem pagar. Para começar é um disparate dizer que quem escolhe escolas privadas é rico. Haverá com certeza muitos ricos que o fazem, mas também há uma grande maioria que o faz com muitíssimos sacrifícios, com apoio da família e até com bolsas dos próprios colégios. Claro que, mesmo assim, há muitos portugueses que não tem essa escolha. Mas isso não torna quem o pode em rico. Para além disso, se a questão fosse realmente o rendimento dos pais, então seria simples criar regras para que este apoio fosse dirigido apenas a quem dele precisa.

Mas não, os manuais são grátis independentemente do rendimento da família, para todos os estudantes do ensino do Estado até ao 12º ano. Ou seja, os pais que escolhem uma escola privada, não só pagam duas vezes a escola, como vão agora pagar também duplamente os manuais escolares.

A exclusão dos estudantes do ensino privado da gratuitidade dos manuais escolares é apenas uma medida ideológica, contra os pais que exercem o seu direito de educar os filhos. Infelizmente em Portugal a liberdade de educar os filhos continua, cada vez mais, apenas ao alcance daqueles que tem dinheiro para a pagar!

N.B.: Muito haveria para dizer sobre a medida da gratuitidade dos manuais escolares. O Governo, diante do problema real do custo imenso dos ditos, devido ao cartel das editoras, em vez de criar mecanismos para impedir o cartel, decide antes tomar uma medida que irá custar milhões ao Estado para continuar a alimentar o negócio das editoras de livros escolares.

Pior ainda, fa-lo de um modo (os famosos vales que paga tarde e a más horas) que arrasa com as pequenas livrarias e favorece as grandes.

Tudo isto subsidiado com o continuo aumento brutal de impostos indirectos, que prejudicam mais gravemente aqueles que já não pagavam manuais escolares devido ao seu baixo rendimento, mas que verão os preços dos produtos que compram aumentar, para subsidiar os livros de quem tem mais dinheiro do que eles.

Assim governa a gerigonça, não para o bem do país, para ganhar votos!

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

"Nem todos tiveram a sorte de ter um pai como o João"




"Nem todos tiveram a sorte de ter um pai como o João" disse Monsenhor Luigi Giussani sobre o Padre João Seabra.

Eu, graças a Deus, tenho a sorte de ser seu sobrinho pelo sangue e, uma graça ainda maior, de ser seu filho na fé.

Hoje o Padre João faz 40 anos de ordenação. Os frutos destes anos são incontáveis e só no Céu os haveremos de os conhecer a todos. Alguns deles são bastante visíveis: o seu empenho na luta contra o aborto e na presença política dos católicos, o Colégio de São Tomás,  Comunhão e Libertação, o seu papel como canonista, etc. Mas muitos deles só ele os conhece e outros nem ele os conhece.

Porque a sua vida foi totalmente entregue a Cristo. Para o Padre João a finalidade de viver é ganhar almas para Cristo. Por isso dizia que há frutos que nem ele conhece, porque ele vai semeando, semeando, semeando por onde quer que passe, com quem quer que se cruze.

E isso é o que me comove mais neste grande homem. Evidentemente que aprecio a sua inteligência, a sua oratória, o seu fino humor, a sua enorme coragem, a tenacidade diante de qualquer circunstância. Mas a sua grandiosidade é que submete todas estas qualidades a Jesus. Toda a sua genialidade está ao serviço do Reino de Deus.

Por isso a sua inteligência nunca é fechada, mas aberta à realidade. A sua oratória nunca é mera retórica, mas anúncio da Verdade. O seu humor nunca é vexatório, mas animador. A sua coragem nunca é bravata, mas sinal de quem já entregou a sua vida a Jesus. A sua tenacidade não é casmurrice, mas consciência da urgência de anunciar Cristo. Sobretudo, as suas enormes qualidades nunca se transformam em soberba, mas em caridade para com todos aqueles com quem se cruza.

Assim foi comigo uma vida inteira. Assim é comigo. Na minha vida Cristo tem um rosto concreto e esse rosto é o do Padre João. Por isso hoje agradeço a Deus essa graça que concedeu à Igreja, a Portugal e ao mundo há quarenta anos. Agradeço sobretudo a graça que me concedeu a mim de ter um pai como o Padre João.

domingo, 21 de outubro de 2018

A voz e o voto pró-vida em Portugal - Observador, 21/10/19

1. Todos os anos, desde 2012, a Federação Portuguesa Pela Vida organiza a Caminhada Pela Vida. São milhares de pessoas que descem à rua para se manifestar publicamente pela defesa da Vida desde o momento da concepção até à morte natural. No ano passado foram mais de 4 mil só em Lisboa, a juntar às centenas que caminharam em Aveiro e no Porto. Este ano a Caminhada Pela Vida irá realizar-se em mais duas cidades: Braga e Aveiro.

Na Caminhada pela Vida foi lançada a Iniciativa Legislativa de Cidadãos “Pelo Direito a Nascer” que recolheu mais de 50 mil assinaturas e resultou numa lei aprovada pelo parlamento e cuja revogação foi decidida pela “gerigonça” no primeiro dia da nova legislatura. Foi na Caminhada pela Vida que se lançou a petição “Toda a Vida tem Dignidade” que, após recolher quase quinze mil assinaturas, continua à espera de ser debatida no Parlamento. Foi na Caminhada pela Vida que começou a campanha contra a eutanásia que incluiu dezenas de sessões de esclarecimento, vigílias por todo o país e uma grande manifestação contra a eutanásia no dia 29 de Maio.

A Caminhada pela Vida é apenas a face mais visível do activismo cívico pró-vida em Portugal. Na última década a Federação Portuguesa Pela Vida, assim como outras associações e grupos cívicos, têm mantido uma enérgica actividade na defesa dos seus ideais. Conferências, petições, sessões de esclarecimento, seminários, estudos. Num país onde escasseia o activismo cívico, a causa da defesa da vida tem demonstrado uma rara vivacidade.

2. Infelizmente esta actividade tem sido invisível para a maior parte dos portugueses.  Invisível porque ignorado pela esmagadora maioria da comunicação social. Mesmo num país onde o activismo cívico é raro, a comunicação social parece nunca reparar quando um grupo de cidadãos se organiza para defender o valor da Vida Humana. Na comunicação social portuguesa parece não haver espaço para a política para além da partidária. De facto, as iniciativas pró-vida só são parcamente noticiadas quando acontecem durante um debate iniciado pelos partidos.

E para provar o que afirmo não preciso de ir muito longe, basta referir três acontecimentos do último ano.

O primeiro: a Caminhada pela Vida, já acima descrita, que apesar de juntar milhares de pessoas, de se realizar em várias cidades do país, de acontecer no contexto do debate da eutanásia, conseguiu ser ignorada pela esmagadora maioria da comunicação social.

O segundo: o congresso sobre a eutanásia organizado pela Universidade Católica, a Rádio Renascença e a Federação Portuguesa Pela Vida, que contou com a presença de grandes académicos portugueses como o Professor Germano de Sousa ou o Professor Miguel Oliveira e Silva e com o especialista holandês Professor Theo Boer. Organizado um mês antes da discussão da legalização da morte a pedido no parlamento não mereceu qualquer tipo de cobertura da comunicação social.
Por fim, a cobertura após a derrota da legalização da morte a pedido. Os telejornais dessa noite limitaram-se a cinco minutos sobre o tema, preenchidos quase totalmente com declarações dos partidos derrotados, aparentemente sem espaço para os movimentos cívicos que realizaram uma grande campanha nacional em defesa da Vida.

3. Mas mais grave do que o silêncio da comunicação social é a falta de representatividade política do movimento pró-vida nos partidos.

Nos últimos 20 anos o Bloco de Esquerda tem dominado a agenda dos chamados “temas fracturantes” em Portugal. O Bloco faz uma política baseada num activismo cívico que tem dominado completamente a agenda do parlamento no que respeita às questões da Vida e da Família. Nestes mesmos vinte anos os partidos de centro esquerda e centro direita (com honrosas excepções no CDS) varia entre uma vaga defesa dos valores da Vida e da Família e uma verdadeira rendição à agenda do Bloco.

E repare-se que não estou a acusar o Bloco de nada: eles têm uma agenda pública, defendem-na sem medo e sem problema algum de utilizar os meios ao seu alcance para a levar por diante.
O problema é mesmo o PS e o PSD que se tornaram reféns desta agenda. O PS simplesmente cedeu à agenda fracturante, tornando-se refém de Isabel Moreira, Pedro Delgado Alves e seus companheiros. Em questões fracturantes já nada hoje distingue o PS do Bloco.

O PSD tem-se mantido mais neutro, mas incapaz de combater esta agenda. Basta lembra que a adopção por pessoas do mesmo sexo foi aprovada com 19 votos do PSD e que as barrigas de aluguer tiveram direito a uma proposta de lei desse partido. Se já no PS é claro que há uma separação entre os eleitores mais conservadores nos costumes e o seu grupo parlamentar, no PSD é cada vez mais evidente que entre as bases e o grupo parlamentar existe uma separação cada vez maior nestes temas.

4. Muito se tem discutido sobre os populismos no nosso tempo. Fenómenos como Trump nos Estado Unidos ou, mais recentemente, Bolsonaro no Brasil têm apanhado de surpresa a maior parte dos jornalistas, comentadores e políticos. Não admira. É sinal evidente que existe uma separação cada vez maior entre estas elites e o povo.

Parte desta separação está na população pró-vida, que (não apenas em Portugal) é ignorada e desprezada pela comunicação social e pelos políticos. De tal modo que muitos dos apoiantes desta causa, frustrados pela invisibilidade do seu trabalho, acabam lá fora por aderir a líderes demagogos que, por ideal ou conveniência (maioritariamente por conveniência) juntam os temas pró-vida a um discurso de revolta contra as elites. De tal modo que conseguem chamar a si, apesar das suas contradições e fraquezas, boa parte daqueles que activamente defendem as causas da vida.

Os movimentos pró-vida em Portugal não têm até agora sido submetidos a essa tentação. Para nós é claro que a dignidade da Vida Humana é um bem não apenas no seu inicio e no seu fim, mas também em todas as fases do seu desenvolvimento. Não aderimos por isso a discursos que defendem a Vida por nascer, mas não o fazem depois do nascimento. Contudo sentimos e notamos entre nós uma frustração crescente pela constante invisibilidade a que o nosso trabalho é votado pela comunicação social e pelos políticos.

5. Vamos entrar em ano de eleições. Primeiro europeias, depois legislativas. Para garantir que o povo pró-vida não volta a ver as suas perspectivas iludidas pelos partidos que supostamente partilham dos nossos ideais para conseguir os votos, mas que os renegam depois na Assembleia da República, a Federação Portuguesa pela Vida vai lançar um questionário a todos os partidos e cabeças de listas que concorrerem às duas eleições. Nesse questionário será perguntado de maneira clara qual a sua posição sobre os temas que movem os movimentos pró-vida.

Assim saberemos com clareza quem de facto defende a causa da Vida na política, assim saberemos com o que contamos quando formos votar. Aquando da discussão da eutanásia o Professor Cavaco Silva falou em duas armas: a voz e o voto. A nossa voz temo-la usado muitas vezes nos últimos anos e somos das poucas forças políticas e cívicas em Portugal que não receia descer à rua. O nosso voto iremos usá-lo no próximo ano denunciando aqueles que promovem a cultura da morte e apoiando aqueles que se comprometeram a colocar a Vida em primeiro lugar.

Membro da direcção da Federação Portuguesa pela Vida.

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Acabar com a "cultura do abuso": educar no amor.





Vivemos num tempo em que a sexualidade se tornou vulgar. Aquilo que era da intimidade dos casais passou a ser público. Em qualquer rua é possível encontrar anúncios com mulheres seminuas; a qualquer hora na televisão vemos cenas (mais ou menos explícitas) de sexo; livros de perversões sexuais ganharam um ar respeitável e são best sellers nas livrarias; as crianças, adolescentes e jovens, são constantemente convidados a explorar a sua sexualidade; os jornais fazem notícias com qualquer mulher que esteja disposta a publicar uma fotografia “sensual” em troca de uns likes.

Aquilo que devia ser íntimo e privado passou a ser tratado como coisa pública. O corpo passou a objecto de negócio. A virgindade e a pureza são hoje objecto de curiosidade mas sobretudo de gozo.

Ora, é evidente que esta vulgarização do sexo, esta objectivação do corpo, esta redução da sexualidade a uma mera necessidade animal tem consequências. Muito se tem discutido sobre a “cultura do abuso”. Mas aparentemente ninguém parece querer reparar na evidente relação entre a hiper-sexulização da sociedade e a tal cultura.

É evidente que num mundo onde é normal e natural exibir o corpo e glorificar a partilha da sexualidade (e não, não estou a exagerar, pensem que a fama de Kim Kardashian se deve a uma sex tape) seja cada vez mais banal impor-se sexualmente ao outro.

Se o corpo deixou de ser visto como um templo, se a sexualidade deixou de ser um assunto íntimo, se a relação entre duas pessoas perdeu todo o seu carácter sagrado, também é evidente que as ofensas contra a sexualidade perderam a sua relevância.

Não é possível ao mesmo tempo educar para o respeito pela intimidade, quando esta é vendida nas capas de revistas e nos sites. Não é possível dizer ao mesmo tempo que é normal e saudável ver pornografia e que é preciso respeitar a intimidade dos outros. Ora, se afirmámos que não há problema em vender a intimidade, que é absolutamente respeitável usar o corpo de outro como objecto, não podemos ficar espantados que haja quem de facto o faça.

Na raiz da “cultura do abuso” está a mentalidade de que o outro é um objecto para usarmos ao nosso prazer. Ora é essa a mesma mentalidade imposta pela “revolução sexual” que hoje vivemos.

Podemos tentar procurar soluções para os abusos sexuais nos beijinhos aos avós, ou nas mudanças de fralda não consentidas. Mas se o fizermos ao mesmo tempo que publicámos fotografias de mulheres seminuas e amarradas estamos a passar uma mensagem contraditória.

Se queremos de facto acabar com os abusos sexuais é urgente voltar a educar para a intimidade (aquela que não se vende), para o respeito pelo corpo (que não é um objecto, nem o meu nem o dos outros), mas sobretudo, é preciso de facto educar para uma sexualidade que é sinal de amor e não uma mera necessidade fisiológica. 

Se assim não for ainda acabamos numa sociedade onde é proibido dar um beijinho a uma criança, mas é legal ver fotografias suas nua.